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Quaresma: pano roxo e Santa Verônica

Leia em PDF terça-feira, 31 de março de 2015

É COSTUME MUITO antigo e piedoso na Igreja que, a partir do quinto Domingo da Quaresma, – também chamado de Primeiro Domingo da Paixão (que é o Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor), – cobrir com panos roxos as cruzes, quadros e imagens sacras. As cruzes permanecem cobertas até o final da Liturgia da Sexta-feira Santa, os quadros e demais imagens até a celebração do Sábado Santo ou de Aleluia, a noite que antecede o Domingo da Páscoa da Ressurreição do Senhor.

O sentido profundo de se cobrir as imagens sacras fundamenta-se no luto pelo sofrimento do Cristo, levando os fiéis a refletir, ao contemplar os objetos sagrados cobertos com a cor roxa, que simboliza a dor, o recolhimento e a penitência. O ápice do despojamento ocorre após a Missa da Ceia do Senhor, na Quinta-Feira Santa, quando retiram-se as toalhas do Altar. A cruz coberta lembra-nos a humilhação de Nosso Senhor, que precisou ocultar-se para não ser apedrejado pelos judeus, como nos relata o Evangelho segundo S. João (10, 31-32.39-40)


O cântico de Verônica durante a Procissão do "Senhor Morto"

Verônica, segundo tradição antiquíssima, enxugou o rosto de Cristo a caminho do Calvário, e a imagem da Sagrada Face ficou gravada no véu. Este episódio não consta das Sagradas Escrituras canônicas, mas já era contado nas comunidades primitivas da Igreja, tan to que o nome de Verônica é mencionado no livro apócrifo “Atos de Pilatos”, do século VI, no capítulo VII, sendo associada à mulher curada de hemorragia por Jesus (cf. Lucas 8,43-48).

Na procissão da Sexta-feira Santa, Verônica canta a Lamentação: “Ó, vós todos que passais pelo caminho, parai e vede se há dor igual à minha dor.” Ressalta a dor do Cristo que padece pela humanidade. Note-se que nos tempos antigos eram comuns os cânticos de lamentação nos velórios, conforme o testemunho dos evangelistas S. Marcos e S. Mateus:

Ao chegar à casa do chefe da sinagoga, viu o alvoroço e os que estavam chorando e fazendo grandes lamentações. Entrou e disse-lhes: 'Por que todo esse barulho e esses choros? A menina não morreu. Ela está dormindo!'” (Mc 5,38-39)
Chegando à casa do chefe da sinagoga, viu Jesus os tocadores de flauta e uma multidão alvoroçada. Disse-lhes:Retirai-vos, porque a menina não está morta; ela dorme. Eles, porém, zombavam dele.” (Mt 9,23-24).

Antes da reforma litúrgica do Conc. Vaticano II, era obrigatório cobrir com véus roxos todas as cruzes e imagens expostas ao culto nas igrejas. No Missal Romano de S. Pio V, terminada a Missa do Sábado, que precedia o Domingo da Paixão (atual V Domingo da Quaresma), vinha esta rubrica:


Antes das Vésperas, cobrem-se as Cruzes e Imagens que haja na igreja. As Cruzes permanecem cobertas até ao fim da adoração da Cruz, na Sexta-Feira Santa, e as Imagens até ao Hino dos Anjos (Glória a Deus nas Alturas) no Sábado Santo”.

Vê-se que era um costume ligado às duas últimas semanas da Quaresma, através do qual se desejava centrar a atenção dos fiéis no Mistério da Paixão do Senhor. Tudo o que pudesse desviá-la, como eram as imagens dos Santos, cobria-se. De onde vinha este costume? Provavelmente dos finais do primeiro milênio da era cristã, ou inícios do segundo.

As normas litúrgicas atuais, segundo rubrica do Missal Romano de Paulo VI, diz que depois da Missa do Sábado anterior ao V Domingo da Quaresma:


O costume de cobrir as cruzes e as imagens das igrejas pode conservar-se, conforme o parecer da Conferência Episcopal. As cruzes permanecem cobertas até ao fim da celebração da Paixão do Senhor, na Sexta-‑Feira Santa; as imagens, até ao começo da Vigília Pascal (cf. Missal Romano atual [Ed. do Altar], p. 206)

Como podemos constatar consultando o Missal Romano, atualmente são dadas opções: a) pode-se cobrir as imagens ou não; b) se cobertas, mantê‑las assim desde a tarde do sábado anterior ao V Domingo da Quaresma até ao começo da Vigília Pascal. A rubrica é clara: “... as imagens permanecem cobertas até ao começo da Vigília Pascal”.
 

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